Fechou a mão Apertou as unhas contra a pele até rasgar. Era o que queria, um ponto físico além, uma extremidade perfeita para direcionar a sua ira. Um outro lugar que não fosse centro, o coração, fragilizado de sensibilidades. Ficou olhando os filetes de sangue vermelho escorrerem. As veias enrijecidas. Os negros pulsos.
Sentia-se numa situação insustentável. De pobreza. De falta de oportunidades. De raça inferiorizada. Uma mão de obra barata. Anônima. Dispensável. Um dejeto do submundo urbano.
Pensou em passar um estilete e acabar logo com a agonia, mas deu-se conta de que não estava vivendo um filme macabro de TV. Sua vida era a sua propriedade. Real. Única. Não havia porque destruir-se, mesmo quando todos a sua volta agiam como se assim o desejassem. Um alívio para a sociedade estressada. De culpas. De interesses.
Ela compreendeu que tudo é uma questão de controle. Quando não se tem nenhum, joga-se de poder com a própria vida. E perde-se o essencial. Troca-se pelo valor dos outros.
A cor da sua pele é apenas a cor da sua pele. Nascer pobre também. Apenas a sua condição. Uma pessoa é o que pensa. O que sente. Os seus valores. O resto, meramente circunstancial.
“Eu não sou as minhas circunstâncias”, gritou.
Ana não se suicidou naquele dia.
©, 2008, Nancy Lix.
3 comentários:
gostei.
Forte !
;Duda;
Nossa! Quem nunca fraquejou e pensou em aliviar o fardo? Mas quem cria esse "peso" somos nós mesmos.
Que bom que Ana sobreviveu e hoje vive!
Obrigado pelos elogios e por visitar o PSQC. Também adorei os comentários lá no Portal Literal. Pena que "Bones" não conseguiu os votos necessários, mas "O Gato" está lá firme e forte.
Voltarei e irei destrinchar mais seu blog.
Besos.
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